- Acórdão: Apelação Cível n. 7.025.605-8, da comarca de São Paulo.
- Relator: Des. Francisco Giaquinto.
- Data da decisão: 21.08.2007.
ACÓRDÃO
EMENTA: Consignação em pagamento - Justa recusa do banco credor, ante a insuficiência dos valores depositados judicialmente - Pretensão de consignar, com efeito de extinção da obrigação, valor das prestações em discordância com o pactuado - Inadmissibilidade - Vigente na hipótese o princípio do pacta sunt servanda - Justa recusa que encontra embasamento no art. 896, II, do CPC - Sentença mantida - APELAÇÃO NEGADA.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N° 7.025.605-8, da Comarca de SÃO PAULO, sendo apelante JAILSON PEREIRA SILVA e apelado B.V. FINANCEIRA S/A CRED FINANC E INVESTIMENTO.
ACORDAM, em Vigésima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça, por votação unânime, negar provimento ao(s) recurso(s).
Trata-se de apelação interposta por JAILSON PEREIRA SILVA, em ação de consignação em pagamento que ajuizou em face de B. V. FINANCEIRA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, contra a r. sentença de fls.75/78, cujo relatório ora se adota, que julgou improcedente a ação, condenando o autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais foram fixados, por equidade, em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais).
Apela o autor (fls. 84/92), procurando reverte a r. sentença alegando, em apertada síntese que: a) foram justificados a abusividade das cláusulas e juros cobrados pela apelada; b) assinou os documentos e, ao preenchê-los a recorrida o fez colocando valores bem superiores e não respeitando o convencionado; c) está depositando o valor para purgar a mora; d) a sentença não analisou as alegações constantes da peça inicial, bem como não se pronunciou acerca das leis ali constantes; e) não se justifica a improcedência da ação em razão da insuficiência dos valores por ele depositados. Postula, assim, a reforma integral do julgado monocrático.
Apelação tempestiva, preparada (fls. 93/95), devidamente processada e respondida (fls. 99/106).
É o relatório.
Não é caso de negar seguimento ao recurso visto que as razões de apelação mal ou bem devolveram o conhecimento da matéria recorrida ao tribunal. Daí porque não é caso de não conhecer do recurso como pretende o apelado na resposta.
Cuida-se de ação de consignação em pagamento julgada improcedente pela r. sentença de fls. 75/78, reputando justa a recusa por pretender-se depositar valores diversos daqueles pactuados.
A apelação não comporta provimento.
Na inicial o apelante admite a celebração de contrato de financiamento com o banco apelado, para aquisição de um veículo, no valor de R$ 87.549,12, para pagamento em 36 parcelas de R$ 2.431,92, admitindo que adimpliu tão somente 14 delas.
Alegou, em suma, que a partir da 15a parcela compreendeu que os valores cobrados pela financeira, ora recorrida, eram abusivos e os juros ilegais, tanto que, mediante cálculo realizado através do site do Banco Central (fls. 26), constatou que estava pagando muito além do valor que de fato devia, daí a necessidade de vir à Juízo, por meio da ação de consignação em pagamento, para depositar o valor correto.
Constata-se que o autor confessou a existência de dívida, bem como o atraso no pagamento da mesma a partir da décima quinta parcela, mas não justificou o porquê de ter realizado os depósitos até então, já que os valores eram superiores, bem como trouxe aos autos valores unilateralmente por ele deduzidos e, portanto, parciais, conforme muito bem ressaltado no julgado a quo.
Ademais, o Código Civil dispõe em seu artigo 335:
Art. 335 -A consignação tem lugar;
I- se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento ou dar quitação na devida forma;
II - se o credor não for, nem mandar receber a coisa em seu lugar, tempo e condições devidos;
III — se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil;
IV- se ocorrer dívida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento;
V— se pender litígio sobre o objeto do pagamento".
E, o artigo 336 do mesmo Codex determina "Para que a consignação tenha força de pagamento, será mister concorram, em relação às pessoas, ao objeto, modo e tempo, todos os requisitos sem os quais não é válido o pagamento ".
Ensina Maria Helena Diniz ao tecer comentários acerca de tal dispositivo legal que "Será imprescindível para que a consignação tenha força de pagamento (...). A consignação deverá ser: livre, não estando sujeita a condição que continha restrição injusta ao direito do credor; completa, abrangendo a prestação devida, juros, frutos e despesas; e real, ou seja, efetiva, mediante exibição da coisa, que é objeto da prestação, (...). Será preciso a observância de todas as cláusulas estipuladas no ato negociai para que o depósito judicial seja considerado pagamento indireto. (...)". (in Código Civil Anotado, 10a edição, reformulada à luz do Novo Código Civil, editora Saraiva, págs. 302/303, comentário acerca do artigo 336). (grifamos).
No caso, o apelante pretende consignar, com efeito extintivo da obrigação, prestação no valor mensal de RS 896,05, quando o pactuado foi de R$ 2.431,92, pretendendo uni lateralmente rever o contrato sem apresentar justifica plausível para tanto, mesmo porque o valor do financiamento e as respectivas taxas de juros foram prefixadas.
Assim, a recusa do banco manifestada na contestação encontra apoio no art. 896, II, do CPC, visto que o valor consignado é inferior ao devido.
Nesse sentido se pronunciou o E. STJ:
AÇÃO DE CONSIGNA ÇÃO. RECONHECIDA A INSUFICIÊNCIA DA OFERTA, HA QUE SE TER COMO JUSTA A RECUSA DO CREDOR, IMPONDO-SE A IMPROCEDENCIA DA AÇÃO. COISA JULGADA. TORNA INDISCUTÍVEL QUE A OFERTA ERA INFERIOR AO DEVIDO, NÃO QUAL O ÍNDICE DE REAJUSTE APLICÁVEL, QUE ESSE TEMA DIZ COMA MOTIVAÇÃO DO DECIDIDO. NEM SE VIABILIZA, NO ÂMBITO DA CONSIGNA TORIA, SEJA EMITIDA SENTENÇA DE DECLARAÇÃO QUANTO AO PONTO.(REsp 38576/SP;RECURSO ESPECIAL 1993/0025102-3; Ministro EDUARDO RIBEIRO; T3 - TERCEIRA TURMA; DJ 13.03.1995 p. 5286).
CONSIGNA ÇÃO EM PA GAMENTO. QUANTIA INSUFICIENTE. RECUSA JUSTA. AINDA QUE APLICADO ÍNDICE INFERIOR AO DETERMINADO PELO TRIBUNAL RECORRIDO, INSUFICIENTE E A QUANTIA QUE SE PRETENDE CONSIGNAR. (REsp 37339/SP;RECURSO ESPECIAL 1992/0023443-7; MIN. CLÁUDIO SANTOS; T3 TERCEIRA TURMA; DJ 20.02.1995, p. 3175).
Aliás, não é outro o entendimento deste E. Tribunal de Justiça:
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - Oferta insuficiente - Demanda improcedente. A oferta insuficiente conduz à improcedência da ação, sendo justa recusa do credor, que não está obrigado a receber menos do que tem direito. (Apelação Cível n. 54.140-4 - Barretos - 9ª Câmara de Direito Privado - Relator: Ruiter Oliva - 16.09.97 - V.U.).
AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – Propositura pela parte que descumpriu o contrato - Inadmissibilidade - Aquele que se encontra em mora contratual, não tem legitimidade para consignar os pagamentos - Havendo justa recusa pelo descumprimento da avença, descabe a consignatória - Recurso não provido. (Apelação Cível n. 16.425- 4 - Guarujá - 2ª Câmara de Direito Privado - Relator: Linneu Carvalho- 10.02.98 - V.U.).
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – Justa recusa – Mudança unilateral do índice fixado - Cabimento dá discussão sobre o "quantum" devido em razão do contrato - "Pacta sunt servanda" - Ação procedente - Recurso não provido (JTJ 118/265).
E, conforme bem anotou a r. sentença apelada: "Assim, afigura-me justificada a recusa da parte contrária em receber valores diversos daqueles pactuados, especialmente em razão do confessado inadimplemento do requerente".
De fato, ante a validade contratual, vige na hipótese o princípio da força vinculante do contrato (pacta sunt servanda).
Daí que cabia ao autor-devedor cumprir com a obrigação nos termos em que pactuados.
E, alegação de que somente depois do pagamento das primeiras quatorze parcelas o valor correspondente às mesmas lhe pareceu ilegal e abusivo, não afasta o descumprimento contratual, tampouco a sua mora, que autorizam a ré a recusar o pagamento.
Justa, portanto, a recusa da apelada em receber as parcelas em atraso e em valores bem inferiores aos pactuados, valores estes, repita-se, unilateralmente calculados pelo apelante.
Ante o exposto, nega-se provimento à apelação, mantendo-se a r. sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Presidiu o julgamento o Desembargador CORREIA LIMA (com voto), e dele participou o Desembargador ÁLVARO TORRES JÚNIOR (Revisor).
São Paulo, 21 de Agosto de 2007.
FRANCISCO GIAQUINTO
RELATOR
Precisa estar logado para fazer comentários.